
Vou dizer-lhe uma verdade: a vida dá muitas voltas e nunca sabemos onde iremos parar. Mas que grande bobagem. Quem ainda não ouviu algo parecido? Quem é que não sabe disso? Comentário piegas e pobre! Sabes escrever ou não? De certo enlouqueceu de vez, perdeu o censo do ridículo para vir falar-me tamanha bobagem. O pior é que sou sempre obrigada a ouvi esses malditos discursos pseudo-intelectuais, filosofias de bolso, ideologismos falsos e vazios. Por repetidas vezes os ouço sem a menor questão de entender, se quer, uma palavra. É porque a razão lhe impede de sentir esses humildes e generosos dizeres. Ficas presa em seus mundos e submundos sem que abras a percepção para aquilo que está a sua volta. Somente vais, seguindo a maré passivamente. És Baixa. És baixa a expectativa que tens de tudo, pois não te arriscas a olhar em volta. Só o que vejo é um grande monte de nada. Nada que faça sentido e inspire um olhar mais atento. Palavras soltas, versos perdidos e frases sem nexo. Essa viseira enorme que estás usando, não lhe permite ver além. Só enxergas a superfície, rasa, e clara. Olhe além dessa calmaria, dessa languidez e verás algo, algum dia, talvez. Pára! Cansei-me de ouvir essas loucuras. Loucuras? Louca és tu que vive nesse lugar. Escuro, sem luz e sem ar. Venha, venha comigo. Não. Mas nem ao menos irás tentar? Nunca! Deixes isso para trás. Foi tua vida até agora, bem sei, é o que conheces, e lhe parece seguro, estável, confortável, mas é pouco. Sei que há mais dentro de ti e fora também. Basta olhar. Vem comigo. Não! Não posso. Tenho muito que fazer aqui, ainda. Há pessoas me esperando. Esperando? E o que estás fazendo? Esperando. Ah que vida medíocre, só esperas. Não ages, não te movimentas. Permaneces aí. Inerte como um vegetal, sugando da terra sua energia. E que terra é essa? Será que ela tem tudo que realmente precisas. Que acharias de ser uma grande árvore em outro lugar? Não me interessa. E o que lhe interessas? Ficar aí? E o mundo, e a vida? E tudo o que existe e que nunca conhecerás enraizada neste mesmo local, como um pequeno arbusto que nunca floresce. Mas aqui está bom. Está tranqüilo, nunca venta, chove apenas o suficiente e o sol vem, vez ou outra. Conheço caminhos de tempestades, mas que possuem os dias mais ensolarados e quentes. Com grandes árvores frondosas e carregadas de doces frutos. Não me incomoda o amargo. ... Posso levar-te comigo, mas preocupa-me a demora, temo que estejas presa demais quando quiseres partir. Tens que ir agora. Agora não. Acho que nunca. Estou bem. Peço-lhe para que pares de repetir essa mentira. Mentira? Porque julgas que o que digo é uma mentira? Já estiveras aqui? Sabes como é bom e seguro, agradável e tranqüilo? Porque, meu Deus, eu haveria de trocar a calmaria por torrenciais? Desista. Não mover-me-ei. Não desistirei, eu jamais desisto. Perdes seu tempo. Nunca. O tempo não pode ser perdido ele é, de uma forma ou de outra, vivido, e viver não é perda de tempo. Ou é nisso que acreditas? Não. Creio que viver é normal. Uma condição que nos é imposta, simplesmente. Normal e imposta, sim, mas porque então não se deliciar com essa natural imposição? Porque não viver mais e intensamente, já que não temos escolha. Viver diferente a cada dia. A rotina impregna a vida de atuações sem significado, de ações e reações automatizadas que fazem com que ela passe cada vez mais acelerada. E quando ela acabar? Não sentirás o vazio de não ter feito mais, ido além? Pode ser. Então, vamos? Eu disse: “pode ser” não disse que isso me incomodava, afinal, quando ela acabar não estarei mais apta a questioná-la, pois não existirei. Então fique aí. Com os pés cravados na terra, alimentando-se dela como um parasita, sem qualquer contribuição, para nada nem para ninguém. Permaneça com sua vida vazia, de pensamentos soltos, sem objetivo, sem finalidade, sem destino, sem futuro. Chega! Cansa-me ouvir tudo isso. Sinto-me enfadada hoje. Ótimo, deixá-la-ei em paz. Hoje.